O muro da vergonha moderno

Em abril de 2016, a decisão do então governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, de erguer um muro de placas de metal ao longo de toda a extensão da Esplanada dos Ministérios marcou um momento de forte simbolismo e controvérsia política. Naquele momento, o país estava polarizado em relação ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, e a medida foi tomada com o intuito de separar fisicamente os manifestantes que apoiavam e os que eram contrários ao impeachment. O muro, que também foi chamado de “Arquitetura do Confronto”, representava, na visão de muitos, a materialização da divisão política que assolava o Brasil. No entanto, com o passar do tempo, essa decisão revelou-se não apenas equivocada, mas também desnecessária, uma vez que o esperado confronto de grandes proporções não ocorreu.
O muro de metal, ao invés de prevenir a violência, tornou-se um símbolo de uma gestão que acreditava mais na contenção do que no diálogo. Em vez de procurar meios de garantir a segurança pública que permitissem a livre manifestação e expressão dos cidadãos, a medida optou por isolar e dividir, criando uma barreira física que, simbolicamente, espelhava a barreira ideológica que já existia. A falta de confronto significativo durante as manifestações mostrou que o receio era, em grande parte, infundado, e que a decisão de construir o muro foi uma reação exagerada à situação.
Esse episódio histórico nos leva a um paralelo inevitável com as decisões tomadas para o desfile cívico-militar de 7 de setembro, em anos mais recentes, quando autoridades optaram por isolar totalmente as pessoas que desejavam assistir ao evento. Ao erguer verdadeiras fortalezas de metal ao redor da área do desfile, como neste ano, criou-se uma sensação de aprisionamento e exclusão. A concepção de Brasília, com seus amplos espaços abertos e a liberdade de circulação que deveria promover, foi subvertida por essa decisão. A cidade, planejada para ser o símbolo da modernidade e da democracia brasileira, viu-se transformada em uma espécie de “muro da vergonha” moderno, onde o livre acesso foi trocado por grades e barreiras.
Essa fortaleza erguida ao redor do desfile de 7 de setembro evoca a mesma sensação de divisão e medo que o muro de 2016. Ao invés de um espaço para celebração e união, a Esplanada dos Ministérios tornou-se um espaço de exclusão, onde quem está dentro não sai e quem está fora não entra. A pergunta que surge inevitavelmente é: o que eles temem? O que justifica a transformação de um evento cívico em um espetáculo cercado, onde a participação popular é rigidamente controlada?
A resposta pode estar em uma percepção de ameaça que, assim como em 2016, talvez seja mais simbólica do que real. O medo de protestos, de manifestações contrárias, ou mesmo de um eventual confronto, parece superar o desejo de celebrar a independência do Brasil em um espaço verdadeiramente democrático. A fortaleza de metal erguida para o desfile de 7 de setembro, assim como o muro de 2016, reflete uma preocupação com a segurança que, ao ser exacerbada, acaba por trair os princípios democráticos que deveria proteger.
Enquanto o muro de 2016 pode ser visto como um símbolo da polarização política do período, a fortaleza de metal em torno do desfile de 7 de setembro representa um retrocesso na liberdade de expressão e de circulação dos cidadãos. Ambas as situações revelam um desconforto das autoridades com a manifestação popular e uma preferência por soluções que, ao isolar e dividir, acabam por enfraquecer os próprios fundamentos da democracia. O resultado neste 7 de setembro, como muitos previam, foi o fracasso, marcado pela ausência de público e uma Esplanada vazia.
Assim, tanto o muro de 2016 quanto a fortaleza do 7 de setembro compartilham mais do que o material de que foram feitos. Eles compartilham uma visão de segurança que se sobrepõe ao diálogo e à participação cidadã, e que, ao invés de proteger, isola. Ambos são lembranças visíveis de momentos em que a liberdade de expressão e a circulação foram limitadas por barreiras físicas que, no final das contas, acabaram por demonstrar que o verdadeiro confronto não estava nas ruas, mas na percepção das autoridades.

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Uma resposta

  1. Muito bem escrito e descrito. O pilar da democracia conhecida como liberdade de expressão acabou, a tal democracia petista é simbolizada pelo muro da vergonha com bem disse. Enquanto houver uma corte suprema contaminada pelo absolutismo, não haverá democracia. Tristes dias!

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