Lula isola o Brasil e tensiona relação com os EUA

Fábio Paiva

A tensão diplomática entre Brasil e Estados Unidos se intensificou nas últimas semanas, impulsionada por disputas comerciais, pressões geopolíticas e pelo alinhamento ideológico e econômico adotado pelo governo Lula. Em vez de buscar um equilíbrio entre soberania nacional e inserção estratégica nos mercados globais, o Brasil tem assumido posições que desagradam a Washington, especialmente no âmbito dos BRICS, da política cambial e das relações com regimes autoritários.

Apesar de o Brasil prever, em lei, o Imposto de Exportação (IE) com alíquota de até 30% (ou 150%, em casos excepcionais), a regra geral é de isenção total (0%), para manter a competitividade das commodities brasileiras. No entanto, a estrutura sobre importações é altamente onerosa. O somatório de tributos como IPI, ICMS, PIS/COFINS e encargos sobre o frete pode elevar o custo final em mais de 75%. Ou seja, importar no Brasil é mais caro do que a tarifa de 50% que os EUA agora ameaçam impor.

A ofensiva de Trump, que voltou à cena política, é impulsionada pela proposta de Lula de desdolarizar o comércio global e criar uma moeda comum dos BRICS — algo que interessa a países sancionados como Rússia e Irã, mas que não conta com o apoio pleno nem dos próprios membros do bloco. Índia e África do Sul já buscam reaproximação com os EUA. A China, embora rival de Washington, mantém gigantescas reservas em dólar e integra plenamente os mercados financeiros globais. O Brasil, isolado na defesa da nova moeda, arrisca retaliações sem suporte real.

Outro fator que acende o alerta em Washington é a aproximação de Lula com regimes autoritários. O Brasil importou mais de US$ 12 bilhões da Rússia em 2024 — fertilizantes e derivados de petróleo — e permite que navios iranianos atraquem em seus portos. Há ainda suspeitas, em investigação internacional, sobre a venda de urânio ao Irã — sendo o Brasil um dos países sob análise.

A escolha do dólar como referência global não foi imposta à força, mas acordada por 44 países em Bretton Woods (1944), inclusive o Brasil. Os EUA detinham à época 70% das reservas de ouro do mundo, uma moeda forte, estável, conversível e papel central na reconstrução do pós-guerra. Mesmo após o fim da conversibilidade em 1971, o dólar continuou sendo o alicerce do comércio mundial. Hoje, 90% das transações internacionais, 60% das reservas cambiais globais e mercados como petróleo, aço e semicondutores seguem ancorados na moeda americana.

Tentar substituir o dólar por uma moeda dos BRICS — sem lastro, sem liquidez, sob regimes instáveis — é um gesto mais ideológico que estratégico. E é aí que está o erro central de Lula: tentar projetar influência sem base técnica, histórica ou diplomática.

Nas últimas semanas, Lula elevou o tom o provocou Donald Trump. Em discurso no Congresso da UNE, em Goiânia, declarou: “Não é um gringo que vai dar ordem a este presidente da República.” Em entrevista à CNN Internacional, disse que Trump foi eleito para governar os EUA, “e não imperador do mundo”. Classificou a ameaça tarifária de “chantagem inaceitável” e prometeu retaliar com a tributação de big techs americanas que operam no Brasil. Em tom irônico, chegou a afirmar que pensou que a carta de Trump fosse fake news, tamanha a audácia do conteúdo. Em momentos anteriores, já havia dito que Trump era uma “aberração política” e que sua derrota para Joe Biden representava “uma vitória da civilização contra a barbárie”.

Trata-se de uma escalada verbal que serve mais à militância do que à diplomacia. Ao tratar Trump como piada — e, ao mesmo tempo, alinhar-se a líderes como Nicolás Maduro, Vladimir Putin e Ebrahim Raisi — Lula transmite a ideia de que valores democráticos são apenas instrumentos de retórica, não de ação. O confronto verbal substitui o pragmatismo — e isso tem custo.

Embora Trump também tenha afirmado que há uma “caça às bruxas” contra Bolsonaro no Brasil, esse discurso serve aos interesses eleitorais internos dos EUA. A crise real não tem nada a ver com Bolsonaro. Trata-se de comércio, moeda, sanções e geopolítica.

Enquanto isso, o Brasil mantém uma estrutura tributária interna altamente protecionista, dificultando o acesso a insumos e tecnologias que poderiam aumentar sua competitividade. Ao mesmo tempo, depende fortemente do sistema financeiro global e do próprio mercado americano, que representa parcela significativa das exportações brasileiras.

O Brasil tenta se equilibrar entre soberania e pragmatismo. Defender a multipolaridade é legítimo, mas ignorar como funciona o sistema financeiro global é caminhar rumo ao isolamento. Criar uma nova moeda exige confiança internacional, estabilidade cambial, liquidez e disciplina fiscal — requisitos que os BRICS, neste momento, não têm.

O governo Trump anunciou uma investigação formal sobre práticas comerciais “desleais” do Brasil. O escopo inclui comércio digital, serviços de pagamento eletrônico, tarifas preferenciais, interferência em processos anticorrupção, falhas na proteção à propriedade intelectual, barreiras ao etanol americano e impactos ambientais. Essa apuração pode embasar sanções comerciais e ampliar a crise bilateral, principalmente agora que ministros do Supremo Tribunal Federal e outras autoridades brasileiras começaram a sofrer sanções, como o cancelamento de vistos para entrada nos Estados Unidos.

A culpa é de Lula, de mais ninguém. Ao insistir em uma agenda desconectada da realidade global, o presidente coloca o Brasil em rota de colisão com sua principal potência parceira — e ainda sem o respaldo concreto dos aliados que pretende liderar.

Fábio Paiva é jornalista e analista em marketing digital e em conteúdo.

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *